Sem votação, especialista apontam caos econômico e analisam impacto em ano de eleição

Câmara dos Vereadores|Representantes de entidades de classe fizeram ato em frente a casa de Leis (Fotos: Josh/Arquivo Pessoal)

As eleições municipais começam para valer em agosto, quando as campanhas dão a largada com a propaganda eleitoral. Mas, em Campos, o clima de disputa esquentou muito antes com o prefeito Wladimir Garotinho e a situação em pé de guerra com o vereador Marquinho Bacellar (SD) e a oposição. O estopim é o impasse acerca da votação da Lei Orçamentária Anual (LOA), texto obrigatório que dispõe sobre o orçamento da cidade para este ano. A última semana foi marcada por troca de acusações e jogo de empurra sobre a responsabilidade pelo atraso na aprovação do projeto de lei. Na quarta, a Prefeitura decretou Estado de Calamidade Pública Orçamentária como consequência. Na quinta, o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ) deu prazo de 72 horas para que Bacellar indicasse uma data para a votação do planejamento orçamentário. Na próxima quarta, a Câmara realiza audiência pública para debater a LOA.

Wladimir|“Querem prejudicar o prefeito, mas prejudicam a cidade”

E a queda de braço em torno da LOA promete ser apenas o primeiro conflito da arena política campista neste ano. Até outubro, mês do pleito municipal, o antagonismo entre os dois principais atores, Wladimir e Bacellar, deve se acirrar. “Parece que a intenção (da oposição) é paralisar a administração municipal para criar uma sensação de dificuldade econômica antes da eleição, o que não existe”, diz Wladimir. “Querem prejudicar o prefeito, mas, estão prejudicando a cidade, a população”.

Marquinho Bacellar|“Me portatei como representante da população”

“A eleição não tem a menor influência sobre a questão da LOA”, responde Bacellar. “Eleição só vou pensar a partir de 16 de agosto, período eleitoral. Até lá, vou me portar como presidente da Câmara e representante da população”.

Economista|Sandro Figueredo

Seja qual for a razão do atraso na aprovação do orçamento, o fato concreto são seus efeitos. Exageros de lado a lado à parte, os reflexos serão sentidos na vida econômica da cidade. A Prefeitura só pode executar gastos que estejam empenhados na lei orçamentária. Sem ela, não é possível pagar salários e fornecedores, sustentar programas sociais e executar obras públicas. “A folha do funcionalismo de Campos movimenta cerca de R$ 80 milhões mensais”, explica o economista Sandro Figueredo. “Se os servidores não recebem, imagine o impacto que isso tem na economia de Campos. E o comércio é o que mais sofre com isso”, afirma.

E é exatamente isso que pode ocorrer caso o texto não seja levado à votação e aprovado até o fim da semana que vem, de acordo com a Prefeitura, pois não haveria tempo hábil para os trâmites burocráticos e a execução da quitação dos rendimentos do funcionalismo.

O problema é que ambos os protagonistas não demonstram nenhuma intenção de sentar à mesa e encontrar uma solução. A Prefeitura diz que todos os prazos para discussão da LOA e eventuais alterações já foram esgotados. A Câmara argumenta que foi ignorada nas suas solicitações de modificações no texto, e que não houve debate público suficiente.

Assim, com Executivo e Legislativo com relações esgarçadas, o terceiro agente dos sistemas democráticos precisou entrar em ação, o Judiciário. “Vamos aguardar esse prazo. A partir daí, vamos avaliar as próximas providências”, disse, na quinta, promotora de Justiça e Tutela Coletiva da Infância e Juventude de Campos, Anik Rebello.

Ex-deputado| Geraldo Pudim

“É preciso haver um armistício. Essa troca de farpas pública, com cada um indo às redes sociais incitar o público como se fosse jogo de futebol, não ajuda a ninguém”, aponta o ex-deputado Geraldo Pudim. “Já estamos vivendo um cenário de eleição”.

Figueredo compartilha de tal entendimento ao apontar que “parece haver questões políticas e pessoais se sobrepondo a aspectos técnicos e de interesse da cidade”. O economista prevê um cenário de muita tensão entre Executivo e Legislativo durante todo o ano: “Devemos ter a tentativa de instalação de muitas CPIs por parte da oposição, que será muito atuante em 2024. As CPIs tradicionalmente são usadas como forma de criar dificuldades para os governos, seja na esfera federal, estadual ou municipal”.

Nesse teatro eleitoral, o enfrentamento entre os Garotinho e os Bacellar não dá indícios de arrefecimento. Muito pelo contrário. Porque o conflito mira para além dos limites campistas. A corrida pelo governo do Estado e pelas cadeiras da Alerj, daqui a dois anos, está no horizonte. Wladimir, na força de sua alta aprovação e com uma eventual vitória expressiva no primeiro turno para a reeleição, se colocaria como um nome cobiçado no tabuleiro político para 2026.

“Os Bacellar ganharam muita força com a eleição de Rodrigo para deputado estadual”, contextualiza Rodrigo Lira, doutor em política e pesquisador do programa de mestrado e doutorado em Gestão de Cidades da Universidade Cândido Mendes. “Ainda mais ao se tornar presidente da Alerj, trazendo muitas verbas para Campos e região. A eleição municipal aqui vai ter relevantes impactos na corrida para o governo do Estado daqui a dois anos”.

Wladimir desvia de perguntas sobre seu futuro político, mas não descarta a possibilidade de concorrer a algum posto nas eleições estaduais. Do que ele tem poucas dúvidas é de que as ações da oposição demonstram um temor da avaliação positiva de seu mandato, e de que sairia muito fortalecido se reeleito.

“Acho que eles (oposição) estão pensando muito à frente (em 2026)”, cogita o prefeito. “Não posso pensar nisso, pois seria até irresponsabilidade. Meu compromisso atual é com a população campista”.

Dessa forma, os especialistas ouvidos pelo J3News ponderam que mesmo com o amplo favoritismo de Wladimir, é fundamental para Bacellar e seus apoiadores minar o capital político do prefeito e diminuir a margem de sua eventual vitória. Nesse contexto, fica mais fácil compreender também por que a LOA é foco de discussão e dissidência. O orçamento a que a Prefeitura terá acesso, e como ele será usado, é determinante para o desempenho da administração Wladimir em seu último ano de governo.

Presidente do PT|Odisséa Carvalho

“Temos a expectativa de um orçamento de cerca de R$ 2,6 bilhões, um dos maiores da história de Campos”, destaca Odisseia Carvalho, presidenta do PT local. “A aprovação ainda este mês da LOA é importante, mas é preciso discutir alguns pontos, como a ausência de previsão de reajuste dos servidores, e o que será destinado a programas sociais e outras áreas”.

Historiador|Fábio Siqueira

O quadro eleitoral campista, no entanto, não é restrito a Garotinhos e Bacellar. Outros agentes vão surgir e ressurgir até o início da campanha propriamente dita, em agosto. “É necessário que evitemos essa polarização entre Wladimir e os Bacellar, com outros nomes entrando na disputa mais à frente. O que é benéfico para a cidade, pois isso promove um maior debate de ideias para a população”, aponta o historiador Fábio Siqueira, membro do diretório do PT de Campos.

O PT terá nome próprio, garantem Siqueira e Odisseia, com a força do governo federal a aumentar a musculatura da candidatura. Entre os nomes cotados estão Carla Machado, ex-prefeita de São João da Barra e deputada estadual, Jefferson Manhães, que deixa a reitoria do IFF este mês, e o sindicalista Helio Anomal.

Não se pode esquecer Caio Vianna, atualmente deputado federal pelo PSD, que tem o peso dos mais de 110 mil votos obtidos no pleito campista de 2020, quando foi para o segundo turno contra Wladimir. “Ainda tem muita espuma em cena para podermos visualizar melhor como vai ficar esse jogo”, avalia Pudim.

O que é LOA?
A Lei Orçamentária Anual (LOA) é a lei que define os recursos públicos a serem aplicados, a cada ano, nas ações do governo, obras, programas, projetos, pagamento de folha salarial, progressão salarial, convênios, entre outros. É o detalhamento da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), na qual é especificado em que será gasto o orçamento de cada secretaria municipal.

A LOA é elaborada pelo Poder Executivo, que estabelece as despesas e as receitas que serão realizadas no próximo ano e precisa ser aprovada pela Câmara de Vereadores, que podem apresentar emendas ao projeto, de acordo com critérios estabelecidos pela LDO.

Ou seja, a LOA é a programação das ações para a concretização das situações planejadas no Plano Plurianual (PPA – desenvolvido a cada quatro anos) e previstas na LDO.
O PPA é o planejamento, a LDO é o anúncio das prioridades do planejamento para o ano, e a LOA é a execução do planejamento para o ano.

A Prefeitura pode ter o financeiro em conta, ou seja, o dinheiro. Mas precisa da LOA, que é a parte fiscal/contábil, aprovada para a execução do financeiro.

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